Domingo parte XXII
(A hora)
Y: Eu me libertei de você ontem.
X: Já era tempo... escolheu a bolsa, mas não esperou 27 dias.
Y: Nem que se eu quisesse, ela era irresistível, usou pra mim o mesmo adjetivo que eu tinha guardado pra ela...
X: Ficou treinando discursos, planejando lugares...
Y: Aconteceu exatamente aonde eu queria, não da mesma forma que eu sempre quis, mas ainda assim não me importei.
X: Nem que se você quisesse poderia, essa mania de controlar tudo, se privar da carne, pra que isso?
Y: Porque eu queria a perfeição, queria que a delicadeza dela adormecesse ao lado da minha gentileza, escolhi até o sofá onde deita-la.
X: Pra que a hora que ela acordasse pudesse ver o sol nascendo na sacada do 6º andar?
Y: Sim, mas ela virou-se para o outro lado, não me ouviu...
X: Deixe-me adivinhar, ela não entendeu?
Y: Eu disse tudo e pior ela desacreditou... contei das vezes em que prolonguei viagens pra acompanha-la, do jeito como esperei 4 meses por ela...
X: Qual era afinal o adjetivo?
Y: Encantadora, ela era... Eu planejei dizer isso com melhores argumentos, mas tropecei, gaguejei, olhei mil vezes as horas no relógio...
X: Aposto que ela achou graça no seu nervosismo, sorriu?
Y: Sim, não sei se para ou de mim, não pude dormir, não quis me aproveitar... Talvez ela tenha interpretado como rejeição.
X: Mas o que você queria era o romantismo...
Y: Sugeri que dormissemos, achei apropriado pedir que ela visivelmente cansada desistisse de pensamentos libertinosos, pedi que se deitasse comigo, que esquecesse do mundo lá fora, tive tanto medo...
X: Do dia seguinte?
Y: De todos os dias seguintes... Não quis dormir pra que não chegasse um amanhã.
X: E não dormiu?
Y: Nem por um segundo, fiquei observando-a durante toda noite, ela parecia, se fosse possível, ainda mais bonita dormindo..
X: Nem por mim você fez isso, nunca me olhava, nunca...
Y: Nem por você que não merecia...
X: E ela merece?
Y: Vale mais do que você, tive vontade de aninha-la, de cuidar dela, não quis a carne, não quis o gozo,eu quis proteger seu sono, embaraçar seus cabelos...
X: Você o fez. Ela acordou nos seus braços, sentiu o cheiro forte de couro novo do seu relógio?
Y: Não, ela acordou no único momento que deixei de observa-la, acordou sozinha e ficou sem saber os meus detalhes, tirei seus sapatos, a levei prum lugar mais confortável e beijei-lhe a testa.
X: Deitou-se também, a cobriu... teu braço doeu por ter ficado apoiada em cima dele pra olha-la mais de perto sem perturba-la...
Y: O outro não... Ficou delicadamente tateando com as pontas dos dedos poucas partes descobertas do seu corpo, eu sabia que aquela era a primeira e última vez que poderia estar com ela, quis salvar cada instante, memorizar cada pedaço dela...
X: Você perdeu uma hora, esperou 4 meses por este momento e teve que adiantar as horas por culpa do verão.
Y: No outro dia eu sabia que ela acordaria com fome, quis preparar um belo café da manhã, mas naquela casa não tinha nada, nada além dos meus olhos exaustos que por ela não se fecharam por horas e esperaram por meses.
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